domingo, 18 de abril de 2010

ÓRFÃOS DE SÍSIFO (é com um s só mesmo!)


Por Fernanda Rezek

Éramos cinco (ainda somos; ninguém morreu). Todos os dias e noites, durante cinco anos, bebíamos um vinho indecente de barato (pior que a vodka com suco e halls, de Goiás), e doce (o vinho!!!). Passávamos horas dentro da faculdade, ou em cada buteco perto dela, ou nas casas uns dos outros; falando. Um dos cinco é ateu; outro, saiu do seminário, foi estudar Direito, mas continuou sendo assistente dos padres que celebravam as missas na São Paulo Apóstolo; o terceiro acreditava que era a reincarnação do Jim Morrinsom (acreditava mesmo; com fé!). Nós; duas meninas não muito adequadas ao que seria o perfil da aluna da Universidade Católica de Goiás entre 94 e 98, parecidas uma com a outra...e completamente diferentes. E iam-se embora; as madrugadas; o vinho horroroso; a filosofia barata; as nossas convicções sólidas aos 16, 17 anos; a certeza de que o mundo seria diferente depois de nós...um exerciciozinho de vaidade e de auto afirmação dos cinco meninos que, hoje (esse é o momento em que eu deixo de me incluir, por motivos óbvios), são três homens e uma mulher enormes, que bateram as cabeças umas nas outras, leram da Náusea à Bíblia, viajaaaaaaaram pelas várias noites de riso, choro, gozo, dor, e tudo mais a que qualquer ser humano está suscetível. Mudaram sim, o mundo. Os Órfãos de Sísifo. Chamavam a gente assim, na faculdade.

Sísifo, na mitologia grega, não era Deus. Aliás, muito pelo contrário; era subversivo contra todos os Deuses, e contra toda ordem. Despertou a ira de Zeus, ao enganar a morte por duas vezes, e, por isso, foi condenado, pela eternidade, a rolar uma pedra enorme e pesadíssima, de mármore, com as mãos, até o cume de uma montanha. Toda vez que ele quase alcançava o topo, a pedra rolava montanha abaixo, e Sísifo tinha que começar tudo de novo. Essa história costuma ser contada pra ilustrar a prática de trabalhos inúteis. Ledo engano; imaginem que, ao rolar a pedra imensa, tantas e tantas vezes por dia, por muitos anos, Sísifo se exercitava e se fortalecia fisicamente e mentalmente. Um dia, com certeza, conseguiu levar a pedra ao topo.

Estranha ocupação! Menos fisicamente agradável que apertar as minhoquinhas, mas, com certeza, estranha.

Até sábado, galera.

Fernanda Rezek

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