quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A morte é um problema dos vivos


Como enfrentar a morte? Como enfrentar a doença derradeira? Como enfrentar a aproximação da experiência da morte que marca a velhice? A ausência de palavras, de símbolos e mesmo de rituais modernos para tais situações lança a angustia que marca essas experiências para o campo do silêncio, da procura pessoal sobre as formas de agir, portar, pensar e sentir.
                Nobert Elias, um dos maiores sociólogos do séc. XX, com seus mais de noventa anos, propõe-se, em “A solidão dos moribundos” e em “Envelhecer e morrer”, a discutir o constrangimento que a doença, a velhice e a morte geram nas sociedades modernas. A partir de um ângulo privilegiado, do nonagenário, desenvolve um relato mais que pessoal, quase íntimo, sobre a relação entre “envelhecer, adoecer e morrer”.
                Busca não apenas desmistificar a morte, falando abertamente sobre ela: “A morte não é terrível. Passa-se ao sono e o mundo desaparece – se tudo correr bem. Terrível pode ser a dor dos moribundos, terrível também é a perda sofrida pelos vivos quando morre uma pessoa amada”. Procura, também, diagnosticar as razões da rejeição da morte e o consequente progressivo isolamento dos moribundos e velhos exatamente no momento em que possivelmente precisariam de maior apoio e reforço dos laços de amizade, respeito e reconhecimento.
“Fantasias individuais e coletivas em torno da morte são frequentemente assustadoras. Como resultado, muitas pessoas, especialmente ao envelhecerem, vivem secreta ou abertamente em constante terror da morte. (...) Aplacar esses terrores, opor-lhes a simples realidade de uma vida finita, é uma tarefa que ainda temos pela frente. É terrível quando pessoas morrem jovens, antes que tenham sido capazes de dar um sentido às suas vidas e de experimentar suas alegrias. É também terrível quando homens, mulheres e crianças erram famintas pela terra estéril onde a morte não tem pressa. Há muitos terrores que cercam a morte. O que as pessoas podem fazer para assegurar umas às outras maneiras fáceis e pacíficas de morrer ainda está por ser descoberto. A amizade dos que continuam vivendo e o sentimento dos moribundos de que não causam embaraço aos vivos são certamente um meio.”
                O alongamento da expectativa de vida, certamente, deixou a experiência da morte mais distante, quase inimaginável para pessoas jovens. No entanto tentar evitá-la, deixando-a o mais longe e oculta quanto possível não é a única forma de posicionar-se frente a esse momento doloroso. A finitude da vida pode oferecer lições valiosas, assumir que ela chegará ao derradeiro final pode nos ensinar muito sobre como agirmos diante de nossas próprias vidas e sobre nossas relações para com as outras pessoas.
                Sentidos de vida não são dados, nem ao menos individualmente construídos. São desenvolvidos na complexa relação “eu e nós”. Refletir sobre a experiência do morrer pode ser de grande valia para aprendermos como viver, afinal “A morte é um problema dos vivos”.

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